Lei de Direitos Autorais e o registro da propriedade intelectual no Carnaval
No Brasil, o festejo de carnaval é considerado um bem imaterial e patrimônio cultural. É a oportunidade de trabalho e desenvolvimento de muitos artistas e comunidades que movem uma economia sazonal e temática para a qual investem tempo e dedicação em suas criações. Estas são consideradas produções intelectuais, bens materiais, arte e negócio sobre as quais seus criadores merecem receber direitos morais e patrimoniais, das quais destacamos as obras musicais e as fantasias.
Reprodução de obras musicais
As produções intelectuais têm direitos autorais protegidos pela Lei nº 9.610/98 independentemente do seu registro, entre elas as composições musicais de gênero carnavalesco. Neste contexto são tidos como titulares da obra os compositores, interpretes, músicos, editores e produtores fonográficos.
Como consta no artigo 30º da lei de direito autoral que o direito de reprodução deverá ser expresso pelo titular colocando à disposição do público a obra, na forma, local e pelo tempo que desejar, a título oneroso ou gratuito.
Quando oneroso, o artista receberá no mínimo 5% sobre o aumento do preço eventualmente verificável em cada revenda do objeto original alienado.
A execução pública da obra musical é sempre remunerada, independente da forma da reprodução, assim os titulares dos direitos patrimoniais recebem, sempre que suas obras são reproduzidas via rádio e TV, em shows, eventos ou mesmo em estabelecimentos comerciais, serviços de streaming e em obras cinematográficas,
Neste sentido, os autores das tradicionais marchinhas de carnaval têm direitos autorais assegurados por toda sua vida e mesmo após o seu óbito seus herdeiros serão contemplados por um período de 70 anos, já nos casos de obras coletivas, o prazo de 70 anos começa a correr após o falecimento do último titular.
É importante notar que paródias sem cunho comercial não configuram infração à estes direitos autorais, e portanto não precisam de autorização para sua criação e nem remuneram os titulares das obras objeto da paródia.
No Brasil, o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (ECAD) é responsável pela fiscalização e remuneração aos titulares das músicas executadas em festas e eventos, particulares e públicos, com ou sem fins comerciais. Mas para que a obra possa ser remunerada pelo ECAD é necessário que o titular esteja filiado à uma Sociedade ou Associação de Gestão Coletiva de Direitos (Abramus, UNB, etc…)
São também obras intelectuais cujos direitos estão protegidos pela referida Lei:
a) textos de obras literárias, artísticas ou científicas;
b) conferências, alocuções, sermões; obras dramáticas e dramático-musicais;
c) coreográficas e pantomímicas, cuja execução cênica se fixe por escrito ou por outra qualquer forma;
d) audiovisuais, sonorizadas ou não, inclusive as cinematográficas.
Qualquer que seja a obra, em sua reprodução deverão constar créditos ao produtor, o título da obra audiovisual, nomes ou pseudônimos do diretor e dos demais coautores, o título da obra adaptada, nome do autor, dos tradutores e dubladores, e se for o caso, nomes dos intérpretes, ano de publicação, assim como nome ou marca que identifique a nova obra.
e) obras fotográficas e as produzidas por qualquer processo análogo ao da fotografia.
O artigo 79 salienta ao autor de obra fotográfica o direito a reproduzí-la e vendê-la observadas as restrições à exposição, reprodução e venda de retratos, assim como os direitos de autor sobre a obra fotografada quando esta se tratar de arte plástica protegida.
f) desenho, pintura, gravura, escultura, litografia e arte cinética.
Em seu artigo 77, a Lei transmite ao adquirente o direito de expor a arte plástica alienada, mas não o direito de reproduzi-la, salvo convenção em contrário.
Portanto, a autorização de reprodução da obra de arte plástica deve ser feita por escrito e se presume onerosa.
Além disso, a Lei de Direitos Autorais também protege ilustrações, cartas geográficas projetos, esboços e obras plásticas concernentes à geografia, engenharia, topografia, arquitetura, paisagismo, cenografia e ciência; adaptações, traduções e outras transformações de obras originais, apresentadas como criação intelectual nova; programas de computador; coletâneas ou compilações, antologias, enciclopédias, dicionários, bases de dados e outras obras, que, por sua seleção, organização ou disposição de seu conteúdo, constituam uma criação intelectual.
Direto autoral e desenho industrial
O design de fantasias carnavalescas também é considerado como produção intelectual ligada às características estéticas, cores, formatos, aspecto artesanal de sua confecção e seu caráter exclusivo que constituem um objeto e este pode ser produzido industrialmente em larga escala ou mesmo customizado para uma peça única.
Outra característica é a conjunção de aspectos inspirados em uma obra original por meio de suas linhas e cores o que não necessariamente torna o objeto em si ou sua finalidade de uso nova, mas há uma criação artística por trás deste objeto que potencialmente configure uma verdadeira obra de arte passível de proteção
Neste sentido, além de serem protegidas pela Lei de Direito Autoral enquanto artigos culturais, algumas fantasias podem obter o registro de desenho industrial por suas características que proporcionam resultado visual novo e original na sua configuração externa e que podem reproduzidos em escala industrial, evitando assim que sejam indevidamente copiadas anos depois por terceiros, muito embora muitas vezes sejam utilizadas apenas num único espetáculo quando as agremiações e escolas de samba concorrem entre si.
Mas em caso real, o criador do desenho industrial poderá ter a necessidade de ingressar na justiça, quando observadas cópias não autorizadas de suas criações. Neste caso o registro de desenho industrial perante o INPI será necessário..
Assim também nasceu o raciocínio acerca da polêmica da dupla proteção no mercado da moda e que pode ser estendido à confecção de fantasias, quando analisamos o caso das bolsas Birkin e Kelly da grife francesa Hermès que as produz artesanalmente e que foram replicadas pela marca paulista Village 284. Naquela ocasião, a marca paulista foi condenada por violar direitos autorais das bolsas. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) entendeu que tais bolsas tratavam-se de verdadeiras obras de arte e as réplicas foram consideradas como cópias ilegais da francesa criada décadas antes.
Vale lembrar que o desenho industrial diferente dos direitos autorais precisa ser registrado. O processo de registro de desenho industrial no INPI pode durar até 18 meses em média e este registro vigorará pelo prazo de dez anos contados da data do depósito, prorrogável por três períodos sucessivos de cinco anos cada.
© Victor Di Sessa é advogado do Malgueiro Campos Advocacia
Teste de biografia