O BACEN APERTOU O CERCO: O QUE AS RESOLUÇÕES 519, 520 E 521 REALMENTE SIGNIFICAM PARA O MERCADO DE CRIPTO

O Banco Central finalmente entregou o tripé regulatório que vai moldar o regime das VASPs no Brasil: as Resoluções 519, 520 e 521.

Nos últimos meses, o mercado viveu uma mistura de ansiedade, especulação e alarmismo — mas agora temos um retrato claro do que está por vir. E, como sempre, a pergunta que importa é: isso tudo faz sentido para um setor que nasceu justamente para descentralizar riscos?

Spoiler: sim e não.

1. A Resolução 519: quem pode, quem não pode e quem acha que pode

A 519 é o “marco zero”: define quem precisa de autorização, quem permanece fora e quem já pode começar a preparar a papelada. O Bacen deixou claro que:

Não existe mais o operador improvisado.

O regime será de instituições altamente supervisionadas, com governança formal e responsabilidade estatutária. O “é só uma plataforma de conexão entre compradores e vendedores” morreu. Se faz intermediação com trânsito provisório de valores ou cripto, você é VASP.

O resultado?

Toda exchange séria do mercado terá que se encaixar em um dos modelos autorizados ou buscar terceirização de custódia. E quem operava “no limiar da lei”… agora vai ter que escolher: formaliza ou fecha.

2. A Resolução 520: o lado prudencial que ninguém queria, mas que veio mesmo assim

Aqui o Bacen revelou sua verdadeira intenção: tratar as VASPs como instituições financeiras no que diz respeito a risco, capital e governança. A regra mais polêmica — e que você já comentou em algumas conversas — é a exigência de três diretores estatutários distintos, cada um responsável por: Risco, Compliance/PLD e Cibersegurança.

Será que faz sentido exigir três diretores para uma operação enxuta que nem sequer faz custódia? Segundo o Bacen, sim. Segundo a realidade do mercado, talvez não.

O custo de compliance sobe. A barreira de entrada aumenta. Os pequenos players vão sofrer. Além disso, o artigo 13 criou um verdadeiro nó: VASPs que operam por conta própria — inclusive market makers, arbitradores e mesas proprietárias — devem seguir as mesmas normas prudenciais das IFs, com gestão integrada de riscos e capital.

De todos os riscos do mercado, esse é o player que menos traz risco sistêmico. Mas, ironicamente, é o que ganhou a maior carga regulatória. Se a intenção era profissionalizar… ok.

Se a intenção era estimular a concorrência… definitivamente não é isso que vai acontecer.

3. A Resolução 521: o detalhe que vira pedra no sapato — segregação, controles e auditoria

A 521 é a mais “operacional” e, por isso mesmo, a que vai doer no dia a dia. É aqui que o Bacen mostra que não confia na matemática do “custódia é só tecnologia”. A resolução exige:

• Segregação plena de ativos (dos clientes e da própria VASP)
• Controles internos de ponta
• Regras de segurança cibernética compatíveis com o nível das instituições financeiras tradicionais
• Auditoria independente
• Planos formais de continuidade de negócios

Para empresas que nasceram no espírito “move fast and break things”, isso é praticamente uma mudança de DNA.

4. O impacto prático: o que vai acontecer agora

• Consolidação imediata

Empresas menores, sem capacidade de bancar três diretorias estatutárias, auditoria recorrente e gestão prudencial, tenderão a:

• se fundir,
• serem adquiridas,
• ou simplesmente sair do mercado.

> Custódia terceirizada vira padrão

Poucas empresas terão braço para manter uma custódia própria com os requisitos da 521. A figura do “custodiante independente” — aquilo que não existia no PL 4401, mas agora surge pela via regulatória — vai explodir.

• Intermediários simples sumiram

O conceito da empresa que só aproxima comprador e vendedor, sem tocar valores…

acabou. Na prática, o Bacen entende que o mínimo trânsito operacional já implica risco.

• A era do improviso acabou

Quem disser que faz “cripto” sem governança, sem comitês, sem políticas, sem diretores estatutários, sem PLD e sem segregação… já nasceu morto.

5. Mas há pontos positivos — e importantes

Apesar da dureza do texto, há benefícios claros para o setor:  Profissionalização real, acaba a farra dos players mal estruturados. Confiança do investidor, políticas de segregação e auditoria reduzem medo de insolvência à FTX. Previsibilidade jurídica, quem sempre operou direito agora tem ambiente estável.

E para empresas internacionais que olham o Brasil como porta de entrada para a América Latina, o framework cria um mapa mais claro.

6. O nosso diagnóstico final

A regulação do Bacen veio pesada? Sim.

Ela pode desencorajar novos entrantes e sufocar modelos inovadores? Provavelmente.

Mas ela também pode eliminar o amadorismo, elevar o padrão de segurança e criar um mercado mais confiável? Com certeza.

Para as empresas sérias, com estrutura e compliance robustos, o momento é de oportunidade, não de retração.

Estamos acompanhando linha por linha, impacto por impacto, e já ajudando clientes na adaptação ao novo modelo.

 

Emília Malgueiro Campos

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