Mais uma grande empresa de prestação de serviços com criptoativos quebra, basicamente por não adotar práticas minimamente seguras de Governança Corporativa para qualquer tipo de empresa, até mesmo aquelas que não são do segmento que nos propomos a tratar nesse artigo.

O responsável por administrar a FTX, terceira maior exchange de criptoativos do mundo, após a decretação de sua concordata, John Jay Ray III, profissional especializado nesse tema e que já atuou em concordatas famosas como a da Enron, levantou práticas corporativas absurdas, tais como inexistência de atas de reunião de diretoria, aprovação de transações e decisões por emojis, ausência de demonstrações financeiras e realização de empréstimos irregulares entre coligadas.

Além disso, uma prática infelizmente comum no mercado de criptoativos causou a derrocada do negócio, a exemplo de várias outras empresas desse mercado: a alavancagem com recursos dos clientes. Esse é efetivamente o câncer desse segmento, se é que ainda isso não foi percebido.

Diferentemente do que ocorre com os bancos, as exchanges de cripto são meros intermediários na compra e venda de ativos virtuais dos seus clientes, sendo que a custódia dos ativos, seja cripto ou Fiat, é realizada por estas apenas para permitir as transações de compra e venda. Os bancos, por outro lado, prestam efetivamente o serviço de depósito dos recursos financeiros e existem previsões no contrato firmado com os clientes sobre o que a instituição está autorizada a fazer com esses recursos durante o período do depósito, bem como outras medidas para garantir que esse sistema funcione, por exemplo, o Fundo Garantidor.

Mas isso não ocorre em relação ao serviço de intermediação da compra e venda de criptoativos, porque não é mesmo tipo de serviço. O objetivo da manutenção de ativos pelos clientes nas exchanges é realizar operações de compra e venda, aproveitando-se da cotação do momento, por isso os criptoativos precisam estar disponíveis na wallet do cliente na exchange.

Nesse sentido, a utilização pela exchange dos criptoativos dos clientes para obtenção de lucros em seu único benefício, sem sequer o conhecimento daqueles, claramente configura um excesso indevido dos direitos da posse que é atribuída pela prestação do serviço de intermediação. Tanto que, em geral, nada é mencionado sobre isso nos Termos de Usos das exchanges.

E foi exatamente isso que a FTX fez, emprestou os recursos dos clientes para suas coligadas. Quando houve uma crise de saques motivada por fofocas de mercado, não havia recursos dos clientes para liquidar os pedidos de saques. E não é, nem de longe, a primeira vez que isso acontece, inclusive no Brasil.

Prejuízo para os clientes e para o mercado. O que é necessário para se entender a importância de segregação patrimonial para as exchanges de criptoativos?

Infelizmente, o artigo do Projeto de Lei 4401/2020 que previa a obrigatoriedade da segregação patrimonial foi excluído pela Câmara dos Deputados e não fez parte da Lei 14.478/2022, sancionada em dezembro.

Prejuízo para os clientes e para o mercado, caso esse grande erro não seja resolvido ou pela edição de uma alteração à Lei 14.478, ou pela regulamentação que será elaborada pelo órgão regulador a ser indicado pelo Poder Executivo, muito provavelmente o Banco Central, vamos aguardar ansiosos.

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