No último dia 30 de outubro a Receita Federal publicou a abertura da Consulta Pública RFB nº 06/2018 para discutir a Instrução Normativa que dispõe sobre a prestação de informações relativas às operações realizadas com criptoativos.

A exposição de motivos esclarece que foi o aumento do volume de operações do mercado de criptos no Brasil que atraiu a atenção da Receita Federal para esse segmento, principalmente tendo em vista que tais operações estão sujeitas à incidência do imposto de renda sobre o ganho de capital auferido.

É interessante notar a frase genérica de que os criptoativos “têm sido utilizados em operações de sonegação, corrupção e de lavagem de dinheiro, não somente mundo afora, mas também no Brasil”. Referida afirmação tem sido um jargão entre os reguladores, não obstante alguns estudos bastante sérios já terem concluído que não é bem assim, como por exemplo o “Crypto-assets” produzido pelo Treasury Committee da House of Commons do Reino Unido, em 19 de Setembro de 2018:

“Quando perguntado sobre o papel dos ativos de criptografia na facilitação da lavagem de dinheiro, David Raw, vice-diretor de bancos e crédito da HM Treasury, afirmou que “as últimas avaliações de risco da Agência Nacional do Crime é que o uso de bens criptográficos para lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo é atualmente baixo. Eles estão vendo casos disso, mas não é difundido.”¹

De fato, é de se imaginar que o aumento de valores negociados de R$363.200.000,00 em 2016 para R$8.300.000.000,00 em 2017, com previsão de atingir 45 bilhões de reais em 2018, efetivamente tem um grande potencial em termos de arrecadação e a Receita Federal não poderia deixar de exigir sua parte, ainda que esse seja um mercado emergente, em plena fase de tração.

E não podemos deixar de mencionar as dificuldades enfrentadas pelo setor junto aos bancos, que vivem criando obstáculos à operação das empresas de cripto, fechando suas contas bancárias e causando inúmeros prejuízos; a ausência de um CNAE adequado para o segmento; a incidência de uma dupla tributação na utilização de criptomoeda como meio de pagamento, ou seja, ganho de capital pela realização em moeda fiduciária, além dos impostos incidentes sobre a operação de compra e venda.

Todos esses aspectos impactam no desenvolvimento de um setor emergente, que ainda não teve tempo para adquirir maturidade e robustez suficiente para atender as exigências regulatórias da Receita Federal, quanto ao fornecimento de obrigações acessórias. Certamente os números demonstram a “relevância” do mercado de criptoativos no País, no entanto, essa análise deve ser feita não apenas sob o ponto de vista da administração tributária, mas também sob o prisma do desenvolvimento do setor. Seria ótimo vermos medidas e projetos para propiciar o desenvolvimento sustentável desse segmento, além das iniciativas da administração para “apertar” a tributação.

Na prática, a minuta de Instrução Normativa trazida na Consulta Pública não traz novidades em termos de obrigações acessórias, em relação ao que já é aplicado a outros segmentos. Em primeiro lugar, quem deve entregar mensalmente informações são as:

  1. Exchanges no Brasil e
  2. Pessoas físicas ou jurídicas residentes no Brasil, quando:

           a) Realizem operações em exchanges domiciliadas no exterior ou

           b) Realizem operações p2p

Observação: no caso do item 2, as informações deverão ser prestadas quando o valor mensal ultrapassar 10 mil reais.

E quais informações deverão ser prestadas sobre as operações? Data, tipo, titulares, criptoativos e quantidades negociadas, valor da operação, valor das taxas cobradas, identificação da Exchange, saldos.

As penalidades por deixar de prestar as informações vão desde quinhentos reais por mês, até 3% do valor da operação a que se refere a informação omitida, além de comunicação ao Ministério Público, quando houver indícios da ocorrência dos crimes de lavagem de dinheiro e sonegação fiscal.

Contudo, não obstante as obrigações acessórias incluídas na Instrução Normativa não serem diferentes do que vêm sendo aplicado a outros setores, é importante o segmento de criptomoedas se manifestar na Consulta Pública, cujo prazo vai até o dia 19 de novembro, enfatizando a necessidade de tempo para o segmento se desenvolver e o quanto a criação de um sandbox regulatório poderia colaborar com esse processo. A Associação Brasileira de Criptomoedas e Blockchain — ABCB — vai promover um encontro dos associados para discutir o tema e preparar sua manifestação.

¹ Disponível em https://publications.parliament.uk/pa/cm201719/cmselect/cmtreasy/910/910.pdf, parágrafo 92.

© Emília Malgueiro Campos 2018

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